"Na margem do rio Piedra eu sentei e chorei. Diz a lenda que tudo o que cai nas águas deste rio – folhas, insetos, penas de pássaros – se transforma nas pedras do fundo. Ah, se eu pudesse arrancar meu coração do peito e atirá-lo nas águas correntes, então não haveria dor, nem saudade, nem lembranças." de Paulo Coelho À margem do rio da linguagem, o sujeito se constitui. Na visão lacaniana, o corte ( la coupure ) é um conceito importante não apenas para a clínica de teoria psicanalítica, mas para a própria possibilidade de transformação subjetiva. Diferente das águas do rio Piedra de Paulo Coelho, onde objetos se cristalizam em pedras, o corte lacaniano despetrifica momentaneamente o fluxo do inconsciente, permitindo que algo novo possa emergir. Corte lacaniano rompe com o encadeamento significante habitual, desestabilizando, com isso, as certezas e abrindo para novas possibilidades. Ele ocorre não apenas no encerramento da sessão, quando finalizamos sem respostas com ...
"Na margem do rio Piedra eu sentei e chorei. Diz a lenda que tudo o que cai nas águas deste rio – folhas, insetos, penas de pássaros – se transforma nas pedras do fundo. Ah, se eu pudesse arrancar meu coração do peito e atirá-lo nas águas correntes, então não haveria dor, nem saudade, nem lembranças." Paulo Coelho abre seu romance invocando uma lenda que tem fonte nos mitos antigos sobre transformação através da dor. O rio Piedra, palavra que evoca tanto pedra quanto piedade, torna-se metáfora de um processo de análise onde o sofrimento se cristaliza em sabedoria, onde lágrimas se petrificam em memória eterna com lições e potência. Mas há algo profundamente psicanalítico nesta imagem inaugural. O desejo de Pilar de "arrancar o coração do peito" vai se encontrar com o que Freud chamaria de pulsão de morte. E ela não é propriamente, como costumam ver, o desejo de morrer, mas de retornar a um estado anterior à tensão, à excitação, ao conflito. E pode ser, como neste ...