A busca pela felicidade é uma característica intrínseca da condição humana. Desde os primórdios, as pessoas se empenham incessantemente para alcançar essa sensação de plenitude. Cada ação, cada escolha, cada sacrifício ressoa com a busca por satisfação. Até mesmo quando nos comprometemos a realizar algo que não desejamos, frequentemente o fazemos por necessidade, numa tentativa disfarçada de nos aproximar da felicidade. O trabalho, seja qual for sua natureza, transforma-se em uma busca por realização, uma forma de alcançar o contentamento que tanto almejamos.
A relação das pessoas com a espiritualidade frequentemente se fundamenta em dois pilares essenciais: a busca pela felicidade e a conexão com uma determinada doutrina. Aqueles que frequentam igrejas e nutrem a fé, muitas vezes o fazem porque, ao se identificarem com aquela crença, encontram um espaço de acolhimento e conforto. Quando se deparam com a complexidade da vida, muitas vezes se voltam para Deus em busca de respostas, atribuindo-Lhe o significado que confundidos não conseguem compreender. Há, nesta busca, algo profundamente natural. O ser humano se foi criado, por sua essência, foi para ser feliz. Embora alcançar essa felicidade nem sempre seja uma jornada fácil, é uma conquista digna de ser perseguida. A busca pela felicidade é um anseio comum a todos nós, e todos devem se empenhar em buscá-la. Na perspectiva cristã, devemos lembrar que o desejo de ser feliz é, em sua essência, uma manifestação do coração de Deus, que deseja para nós uma vida plena de alegria.
Nesse âmbito, a vontade de Deus não pode ser vista como uma negação do ser humano, mas sim como um convite à realização plena. Se almejamos a felicidade, é porque Deus, em Sua infinita bondade, desejou antes de tudo por nós. O cristianismo nos ensina que a busca por essa conexão divina é guiada pelo Espírito Santo, uma força interna que nos cativa e nos lembra de nossa necessidade de experimentar a verdadeira felicidade. A carência que sentimos por Deus é, de fato, uma evidência dessa relação divina, uma busca instintiva por uma plenitude que nos completa.
Em nosso íntimo, aspiramos a ser seres completos; homens e mulheres que se encontram com seu verdadeiro eu, que perseguem seus sonhos, que olham para a vida com um sorriso e fazem dela uma parceira de alegria. Essa “ânsia do melhor”, que pode ser descrita como um impulso dado por Deus, reflete o desejo de um Pai que nos quer realizados. A vontade divina não pode ser oposta ao que nos leva a sentir plenitude e verdade. Eu creio firmemente que acreditar nisso é algo que nos fortalece.
Por outro lado, até mesmo a desistência de lutar pode ser vista como uma busca errônea pela felicidade, uma maneira inconsciente de se afastar do que realmente importa. É bonito imaginar que essa sedução à felicidade seja uma manifestação da presença divina em nós. Todas as culturas, as religiões e as crenças que vão em contrário ao nosso desejo inerente de bem-estar afastam-se da imagem verdadeira de Deus, revelada na figura de Jesus. Um Deus que é amor, que é Pai.
No livro de Gênesis, encontramos a essência dessa verdade. O Criador manifesta um cuidado excepcional na criação, afirmando que tudo o que fez era "muito bom" (Gênesis 1:31). Ele nos convida a refletir sua perfeição. Fomos criados à Sua imagem (Gênesis 1:26), mas muitas vezes, projetamos nossas complexidades e emoções humanas sobre a figura do Criador, associando atributos como ira, desejo de guerra e vingança a Deus. Na verdade, devemos nos esforçar para ser a “imagem de Deus” em amor e ternura, e não o contrário.
Ao criar a humanidade, Deus nos oferece um mundo repleto de recursos, colocando tudo à nossa disposição (Gênesis 1:26b, 29-30). Sua intenção era que vivêssemos a felicidade e o bem-estar como filhos amados, mesmo quando nos desviamos do caminho. Mesmo diante da desobediência, Deus compreende que muitas vezes buscamos felicidade sem saber como fazê-lo corretamente.
Deus, em Sua infinita pedagogia, exerce a correção por amor (Gênesis 3:23). Provemos da vida através de nossas conquistas e esforços, sempre com a força divina nos apoiando. Ao longo da história da salvação, a dedicação de Deus à humanidade se revela cada vez mais; Sua misericórdia se revela gradualmente, atingindo seu ápice na figura de Jesus, que nos apresenta Deus como “ABA”, o Pai.
Diante disso, é importante refletirmos sobre a essência da divindade que buscamos. Se devemos nos permitir viver a experiência de Deus em nós, que seja um Deus de amor e misericórdia infinita, capaz de suprir a carência que habita o nosso ser. Afinal, somos feitos para a felicidade, e essa felicidade é, em última análise, a realização do desejo de Deus para nós.
texto escrito em maio de 2006.
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