Se afetar pelo que pensa é dádiva da maldição em ser gente.
Não conseguimos, felizmente, capturar o terror do Real totalmente. O esforço nos permite, parcialmente e apenas, escapar da angústia flertando com o Imaginário e, quando possível, um pouco de elaboração no Simbólico.A afirmação "Se afetar pelo que pensa é dádiva da maldição em ser gente" suscita reflexões profundas sobre a condição humana, especialmente quando analisada sob a perspectiva da psicanálise lacaniana. Essa proposta nos leva a considerar a intricada relação entre pensamento, afeto e a estrutura da subjetividade.
A expressão "dádiva da maldição" encapsula uma dualidade fundamental da experiência humana. O ato de pensar confere ao ser humano uma capacidade única de introspecção e autocrítica, permitindo-lhe questionar sua própria existência e lugar no mundo. No entanto, essa liberdade de pensamento também acarreta um fardo. Somos constantemente confrontados com angústias e ansiedades que emergem do inconsciente. Lacan afirma que "o inconsciente é estruturado como uma linguagem", o que implica que a linguagem, embora possibilite a expressão de nossos pensamentos e emoções, também nos confronta com a confusão presente na contradição em nossos desejos e medos.
Quando analisamos a afirmação de que "não conseguimos, felizmente, capturar o terror do Real
totalmente", reconhecemos a natureza esquiva do Real na teoria lacaniana. O Real, em sua essência, é aquilo que resiste à simbolização, uma realidade que não se deixa prender por palavras ou representações. Lacan descreve o Real como "aquilo que não cessa de não se inscrever", indicando que sempre há uma parte da experiência humana que escapa à nossa compreensão. Essa inatingibilidade do Real gera uma angústia existencial que nos impõe o desafio de confrontar o desconhecido.
A menção ao "flertar com o Imaginário" revela uma estratégia comum que o ser humano adota para lidar com a angústia gerada pela falta. O Imaginário, que se relaciona com as identidades que construímos e com as imagens que projetamos, oferece um espaço de refúgio emocional. Lacan aponta que "o narciso se liga à imagem do eu", sugerindo que buscamos a construção de um eu idealizado, como uma forma de enfrentar a insegurança inerente ao fato de ser gente. Essa busca por imagem e identidade oferece uma sensação de completude, mesmo que ilusória e, quase sempre, efêmera.
Por fim, a ideia de que podemos realizar "um pouco de elaboração no Simbólico" evidencia a importância da linguagem e dos códigos culturais em nossa experiência. O Simbólico serve como um recurso vital para a estruturação da realidade e da subjetividade, permitindo-nos atribuir significados às experiências e encontrar uma forma de expressá-las. Lacan afirma que "o significante representa o sujeito para um outro significante", o que demonstra como a comunicação simbólica é essencial para o entendimento de nós mesmos e de nossas relações.
Assim, a reflexão proposta aqui em questão realça as tensões intrínsecas à condição de sermos humanizados. A interrelação entre o que pensamos, o que sentimos, e a realidade que nos cerca forma um campo de luta e descoberta. A psicanálise lacaniana nos proporciona uma compreensão mais ampla dessa complexidade, revelando que a angústia, embora desconfortável, é uma parte vital da nossa experiência de existência e do desafio de aceitar que somos humanos mobilizados para ser deuses.




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